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Em Memoria da Estrela

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“Brilha, brilha estrelinha
E não pare de brilhar
Ilumina a minha noite,
Vem na janela cantar
Brilha, brilha estrelinha
Venha nos abençoar.”
- disseram aqueles pequenos lábios.

Ela olhava para o céu, para mim, com fascinação. Juntou suas mãos e começou a rezar como todas as noites. Não falava, mas eu sempre imaginei que pedia a Deus, mais ou menos assim: “Olá, Senhor, sou eu, Clarice. Por favor, proteja a mamãe e peça ao papai ai no céu para fazer o vovô sorrir.” Terminada a oração, fechou as janelas e foi dormir.
Eu fiquei ali, brilhando, e quando o Sol nasceu imaginei que a casa acordava de novo: que a escada rangia sobre os passos de alguém, que o chuveiro deixava escorrer água, que os pratos e talheres faziam barulho. E então a porta se abria, a garotinha e um velho homem saiam, ela era levada para a escola e durante o dia não olhava para mim.
Quando ela estava sozinha, de noite, às vezes chorava bem baixinho e soluçava um pouco, mas naqueles momentos, enquanto estava com outras pessoas, sempre sorria e se mostrava feliz. Ela gostava de desenhar, escrever e brincar nas aulas, e no fim da tarde o avô voltava para pegá-la, daí iam ao hospital, sempre para aquele mesmo quarto onde a mãe dela dormia imóvel, em coma.
Ela sentava na beira da cama e colocava sua mão sobre a da mãe. Contava o que havia feito, mostrava seus desenhos e escritos, o avô mal falava, ficava sempre quieto num canto, olhando a menina com um misto de pena e amor. Não ficavam muito tempo, o horário de visitas era limitado, e quando tinham que ir embora, ela beijava a bochecha da mãe e sussurrava: “Eu te amo, mamãe, até amanhã.”
Quando chegavam a casa eu novamente não ouvia ou via nada, mas pensava que jantavam; depois de um tempo ela ia para o quarto e abria a janela, já começava a escurecer e ela me procurava no céu, observava por um tempo e repetia sua prece.

Não sei por quanto tempo olhei para ela, mas em algum momento ela cresceu e o avô faleceu, enquanto a mãe continuava dormindo. Depois, novamente ela envelheceu, achou uma pessoa para passar seus dias, a mãe se foi e ganhou filhos. Por último ela também morreu, mas em toda sua vida nunca deixou de olhar para mim, me achar linda...
Um dia, eu sabia disso, também iria morrer. Primeiro ia brilhar como nunca antes, depois encolher e virar uma anã branca e dai, eventualmente, explodiria me tornando uma supernova e aquilo que sobrasse de mim talvez criasse novas estrelas.
Sabe, é maravilhoso e confuso ser uma estrela. Nós iluminamos a noite eterna do universo, mas não temos certeza se é real aquilo que vemos... Às vezes estamos tão longe de qualquer coisa que não dá para saber se somos passado ou presente. É estranho pensar que mesmo depois de morrermos os humanos ainda nos vejam como se fossemos recém-nascidas, é engraçado ser uma memória da distância. Mesmo quando eu morrer, qualquer um que olhar para o céu ainda vai me ver, é reconfortante ser eterna...

“Brilho, brilho menininha
Lá no céu eu vou brilhar,
E minha luz que te ilumina
Nunca vai se apagar.
Brilho, brilho menininha
Por você eu vou ficar.”


Lais Nogueira Cardoso

Dedicado a Jamile de Oliveira, em comemoração ao seu décimo sexto aniversário.
Uma estrela conta da sua existência e da vida que observa.
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